O estúdio revitalizou Donkey Kong, trouxe gráficos computadorizados para o Super Nintendo, carregou o Nintendo 64 nas costas e trouxe alguns dos jogos mais memoráveis dos anos 90. A Rare tem muito do que se orgulhar de seu passado. Porém no presente, resta apenas uma pergunta: O que aconteceu com a Rare?
Desde a aquisição do estúdio pela Microsoft, em 2002, pouco se ouviu sobre a Rare e seus jogos. O estúdio não deixou de existir, sendo responsável por alguns jogos para os consoles Xbox, mas seu ritmo certamente diminuiu comparado aos seus anos dourados. Por isso, vamos trazer a você um pouco sobre a história deste estúdio que, sim, ainda está firme e forte.
Ultimate: Os Primeiros anos
O estúdio Ultimate Play the Game foi a base para a criação da Rare, dos irmãos Stamper.
O estúdio surgiu após o esforço de outro estúdio britânico: Ultimate Play the Game. Especialistas em games para o computador ZX Spectrum, os irmãos Tim e Chris Stamper acreditavam que o futuro dos videogames não estava no ZX, restrito apenas ao público britânico, mas sim, no Famicom, console que haviam importado do Japão, cujos primeiros frutos eram dados nos Estados Unidos, como o NES.
Após sessões de engenharia reversa com o novo console, o estúdio foi capaz de compreender melhor como funciona o desenvolvimento para o aparelho e assim, serem capazes de programar novos jogos. Após alguns jogos para computador com recepção aquém do esperado, os irmãos Stamper decidiram por migrar de vez para os consoles. Migrar de vez para a Nintendo.
O primeiro parceiro da Nintendo fora do Japão
A Rare conseguiu criar alguns sucessos clássicos como o Battletoads
Em uma jogada arriscada, quando muito do cenário europeu de games ainda rondava em torno de computadores como o ZX Spectrum e o Commodore 64, os irmãos Stamper venderam o Ultimate para a distribuidora U.S Gold e então fundaram a Rare, com o único intuito de seguir em parceria com a Nintendo, focando exclusivamente o NES.
A Rare aproveitou os primeiros anos de Nintendo, e sua obscuridade dentro do mercado britânico para aprender alguns truques do que era possível ser feito no hardware da Nintendo, aproveitando-se dos investimentos que eram feitos pela empresa japonesa para se manter no azul.
Os jogos lançados durante este período não eram espetaculares, mas eram mais que o suficiente para que fossem capazes de aprender a arte de desenvolvimento para consoles. O primeiro jogo desenvolvido para a Nintendo foi Slalom, seguido de R.C Pro Am e Anticipation. Apesar da parceria com a Nintendo, a Rare foi capaz de produzir jogos em parceria com outras distribuidoras, como Wizards & Warriors e WWF WrestleMania, publicados pela Acclaim, jogos licenciados para filmes como Uma Cilada para Roger Rabbit e A Hora do Pesadelo pela LJN, e o seu primeiro grande hit: Battletoads, pela Tradewest.
Com o sucesso, a Rare foi incumbida pela Tradewest com sequências do jogo, incluindo um crossover com sua principal franquia: Double Dragon. Era o primeiro sinal de sucesso do estúdio a nível mundial, após anos adquirindo experiência. Ainda assim, optaram pela qualidade ao invés da quantidade e quando a Nintendo lançou o Super Nintendo, em 1991, a Rare permaneceu focada na franquia Battletoads e investiu em novas máquinas de computação gráfica da Silicon Graphics. Eles eram naquele instante, o estúdio de games mais bem equipado do Reino Unido.
A Nintendo retorna: Rare se torna Rareware
A pareceria ao longo dos anos da Rareware com Nintendo foi capaz de trazer diversos frutos, esses jogos que são grandes clássicos até os dias de hoje
E todos estes investimentos chamaram a atenção da Nintendo, que após receber uma demo de um jogo de boxe em CGI do estúdio, passou a buscar o talento deles para novos jogos, exclusivos de seu console, o Super Nintendo. No ano de 1994, a Nintendo adquire metade da Rare, que se torna Rareware e encomenda um jogo, com o personagem de escolha do estúdio, apenas com uma exigência: Que fosse inteiramente feito em computação gráfica, utilizando-se dos computadores da Silicon Graphics que haviam adquirido.
Saiu dos próprios irmãos Stamper a escolha de criar um jogo da franquia Donkey Kong.
Donkey Kong Country foi o grande jogo de 1994. A trilogia original é considerada como três dos melhores jogos de plataforma de todos os tempos. Isto não apenas colocou Donkey Kong de volta ao jogo e a fama, mas também colocou a Rareware no topo, entre alguns dos melhores estúdios de jogos de todo o mundo.
O jogo deu carta branca para a Rareware ousar mais em jogos para os consoles Nintendo. Para os fliperamas e para o SNES, a Rareware trouxe Killer Instinct, surfando na onda começada por Street Fighter II e Mortal Kombat. No Nintendo 64, a Rareware teve sua fase mais experimental, com jogos em diversos gêneros. Não somente retornaram com Donkey Kong, lançando Donkey Kong 64 e Diddy Kong Racing, como também lançaram Blast Corps, enquanto se preparavam para outro hit: GoldenEye 007.
Surfando na moda dos jogos em primeira-pessoa, mas sem apelar para a violência gratuita, como visto em Doom, Quake e Postal, o jogo aposta no que James Bond sabe fazer de melhor: Sendo ele um agente secreto, há um equilíbrio entre a ação do jogo de tiro e a discrição de um jogo stealth, além de outros detalhes que não eram tão comuns em jogos FPS naquela época, ainda mais em um console.
O simples fato do jogo suportar multiplayer para até 4 pessoas fez de GoldenEye 007 um jogo obrigatório para todo dono de Nintendo 64. Mas não parou por aí. Perfect Dark aperfeiçoou o que GoldenEye 007 trouxe para o console, levando o Nintendo 64 ao absoluto limite e novamente colocando a Rare na dianteira entre os grandes estúdios de jogos do mundo.
Inspirando-se nos personagens de Diddy Kong Racing, a Rareware tinha a ambição de criar um jogo para alguns personagens. Um deles tornou-se uma franquia: Banjo-Kazooie, um jogo de plataforma em um mundo aberto que compete com Super Mario 64 como o melhor jogo de plataforma do Nintendo 64. Já o outro tornou-se um ícone cult, tamanha a sua irreverência: Conker's Bad Fur Day foi completamente reinventado após seu primeiro protótipo ter sido mal-recebido pelo público. Com piadas mais maduras e diálogos cheios de palavrões, foi o jogo mais ousado a sair do console de 64 bits.
O crepúsculo dos devs: Rareware sai, Rare volta e Microsoft entra
A mudança de volta para Rare e para a nova casa na Xbox tevenovos jogos, porém sem o mesmo sucesso que tiveram na Nintendo.
O primeiro jogo da Rareware no Nintendo GameCube também seria seu último: Star Fox Adventures, originalmente Dinosaur Planet, embora bem recebido, não agradou os fãs de Fox McCloud, que esperavam no jogo, uma grande continuação de StarFox 64. Além disso, os membros do estúdio estavam apreensivos com uma possível venda da Rareware a outra empresa que pudesse se interessar em seus serviços.
A empresa era a Microsoft.
No ano de 2002, a companhia de Bill Gates, que havia recém-lançado o Xbox, comprou o estúdio britânico por 375 milhões de dólares: um valor alto por alguns dos maiores talentos da indústria.
A expectativa era de que, assim como foi com a Nintendo, a Rareware, agora novamente Rare, agisse como o braço direito da Microsoft Game Studios. Também esperavam que trouxessem ao estúdio novato a experiência necessária para melhorar seus próprios jogos.
A realidade é que, apesar de poderem levar Perfect Dark, Banjo-Kazooie e Conker consigo, a Rare teve de renunciar a Donkey Kong Country e Star Fox. Donkey Kong Racing, sequência de Diddy Kong Racing que estava em desenvolvimento, foi cancelado. Os primeiros jogos sob nova direção, Grabbed by the Ghoulies e Conker: Live and Reloaded, fracassaram em vendas no Xbox. Os desenvolvedores buscaram refúgio no mercado de jogos para portáteis, onde a Microsoft não tinha presença. A Microsoft os chamou de volta para o desenvolvimento de novos exclusivos para o Xbox 360 pouco depois.
Desenvolvidos às pressas, Perfect Dark Zero e Kameo: Elements of Power marcaram presença no lançamento do novo console. Mas um terceiro jogo, o qual a Rare apostava todas as suas fichas, Viva Piñata, teve uma recepção abaixo do esperado, apesar das críticas positivas ao seu visual inovador.
Desenvolvedores da Rare passaram a externar timidamente suas insatisfações com a Microsoft, com grupos de desenvolvedores saindo do estúdio. A cereja do bolo foi a saída dos próprios fundadores, os irmãos Stamper, em 2007.
Trevas e luz: Do Kinect ao Sea of Thieves
As novas empreitadas da empresa com Kinect Sports foi um maior sucesso; Banjo-Kazooie Nuts'n'Bolts sofreu problemas de desenvolvimento, e a Rare só foi obter um grande sucesso novamente com Sea of Thieves depois de anos de fracassos e dificuldades.
Sob o comando da Microsoft, houve uma debandada de desenvolvedores da velha guarda da Rare, afetando jogos como Banjo-Kazooie: Nuts and Bolts, que, apesar das críticas positivas de especialistas, foi tido como decepcionante pelos fãs da franquia.
A Rare licenciou os direitos de Killer Instinct para a Double Helix Games que, sob supervisão, desenvolveu o reboot da franquia de 2013. Apesar de ser considerado raso no quesito conteúdo, foi bem recebido pelo público. Enquanto isso, a Rare ficou encarregada de desenvolver os jogos da franquia Kinect Sports, para promover o sensor de movimentos do Xbox 360 e do Xbox One.
O retorno da Rare a linha de frente do desenvolvimento de jogos foi no ano de 2018, com o aguardado projeto Sea of Thieves. Apesar da recepção mista, principalmente acerca do sistema de microtransações, o jogo teve grande retorno entre fãs de PC, Xbox One e Xbox Série, onde o jogador pode, em um mundo aberto, ser um pirata, podendo compartilhar a jornada com outros jogadores online. O “Melhor jogo da Rare”, como a Microsoft promoveu o jogo, conseguiu mais de 40 milhões de jogadores em diversas plataformas e certamente, colocou a Rare novamente no mapa após anos de obscuridade.
Enfim, onde ela está agora?
Rare está atualmente só mantendo o Sea of Thieves enquanto licencia vários de seus IPs para outras desenvolvedoras, inclusive com o marcante triunfo com a volta de Banjo-Kazooie no Super Smash Bros. Ultimate como um personagem jogável, após anos sem nenhum jogo da Rare em um console da Nintendo.
Em 2020, a Rare supervisionou o desenvolvimento de um novo Battletoads pela Dlala Studios. A reação pelo jogo foi mista., mas trouxe a franquia para uma nova geração de jogadores. Em 2019, a Nintendo se interessou pela adição de Banjo-Kazooie no Super Smash Bros. Ultimate, sendo a primeira parceria entre a Rare e a Nintendo desde 2002.
A Rare também licenciou a franquia Perfect Dark para a The Dark Initiative, que neste momento desenvolve um novo jogo em parceria com Crystal Dynamics. O objetivo é um verdadeiro reboot da franquia, que será exclusiva para Windows e para os Xbox Série. A equipe de desenvolvimento conta inclusive com alguns membros que fizeram parte do jogo original de 2000. A gameplay foi revelada em Junho deste ano, mas ainda não possui previsão de lançamento.
No momento, a equipe da Rare trabalha para a produção de Everwild, um jogo ainda em desenvolvimento para PC e Xbox Series. Em 2022, o estúdio previu o lançamento em 2024. Estamos em outubro. Mas segundo informações da Windows Central, as últimas informações sobre o jogo da Rare é que está “finalmente em um rumo saudável para seu desenvolvimento”.
Vejamos se ainda são capazes de replicar a mágica de seus anos dourados.